Caso Miguel

Caso Miguel: Marcas da sandália da criança ficam em equipamento escalado antes da queda no Recife

O menino Miguel, de 5 anos, morreu após cair de uma altura de 35 metros na última terça-feira (2), no prédio em que a mãe trabalhava como empregada doméstica. O caso teve repercussão nacional

Suzyanne Freitas
Suzyanne Freitas
Publicado em 05/06/2020 às 12:04
Reprodução/TV Jornal
FOTO: Reprodução/TV Jornal

Nesta sexta-feira (05), a produção da TV Jornal conseguiu um vídeo que mostra o local por onde passou o garoto Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, antes de cair do 9º andar, na última terça-feira (2), do condomínio de luxo Píer Maurício de Nassau, conhecido como Torres Gêmeas, no bairro de São José, na área central do Recife, onde a mãe trabalhava como empregada doméstica.

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Após sair do elevador de serviço no 9º andar do prédio, procurando pela mãe, Miguel abriu a porta que dá acesso ao hall onde ficam os condensadores de ar condicionado. Em seguida, ele caminhou pelo corredor e sobe em uma janela. Nas imagens, é possível perceber as marcas da sandália que menino usava em um dos condensadores.

Ele teria passado pelos equipamentos, ido até a grade de proteção e pisado em uma das hastes, que não aguentou o peso, quebrando. Foi então que ele caiu de uma altura de 35 metros.

Governador de Pernambuco se pronuncia

O Governador de Pernambuco, Paulo Câmara, falou sobre a morte do menino. Em mensagem divulgada nas redes sociais, ele afirmou que a investigação e esclarecimento do caso “devem acontecer no prazo mais breve possível”.

Reações

A morte do menino miguel também gerou reações de diversas instituições no Estado. O coletivo Rede de Mulheres Negras de Pernambuco chamou a atenção para a questão racial do crime.

Não foi mera fatalidade

Segundo o Gabinete de Assessoria Jurídica ás Organizações Populares (Gajop), a morte da criança não foi uma mera fatalidade e que o fato da mãe estar trabalhando durante a pandemia por si só já era uma irregularidade. O gabinete se colocou à disposição pra ajudar judicialmente a família.

Ajuda à patroa

Abalada a mãe de Miguel, Mirtes Renata, desabafou sobre os últimos momentos com o filho e disse que quando viu o corpo do menino caído no chão do prédio chegou a pedir ajuda à patroa.

Repercussão

O Caso do menino Miguel repercute no mundo inteiro e pelas redes sociais vários artistas prestam solidariedade a mãe e a família do garoto. A #justiçapormiguel alcançou o primeiro lugar entre os assuntos mais comentados em todo o Brasil. A cantora Marília Mendonça expressou pelo twitter a revolta com o caso.

A apresentadora do SBT, Maísa, divulgou o link de uma petição online cobrando justiça. O documento já conta com um milhão de assinaturas.

Pai de Miguel faz questionamento

A tristeza que tomou conta da mãe do menino Miguel Otávio Santana da Silva não foi menor para o pai. Indignado com a perda do filho. Ele cobrou mais investigações sobre o caso e quer que a dona do apartamento onde a mãe do menino trabalhava explique tudo o que aconteceu.

‘’A gente vai correr atrás (de justiça). Hoje foi meu filho, estou com dor, mas vamos correr atrás e descobrir o que houve. Vamos querer saber tudo. A patroa dela tem que explicar. Tem que explicar por que deixou o menino só? Por que não deixou o (filho) dela só e deixou o meu?’’, questionou.

Sonho em ser jogador de futebol

As recordações de Miguel Otávio Santana da Silva estão vivas nas mentes de quem conviveu com a criança. Na escola onde o garoto estudava, desde o maternal, todos sabiam que o sonho dele era ser jogador de futebol. No caderno dele, ficaram gravadas as primeiras letras de uma história que foi interrompida.

Liberada após fiança

Na quarta-feira (3), a Polícia Civil autuou a patroa em flagrante pelo crime de homicídio culposo, quando não há intenção de matar. A mulher, que era empregadora da mãe de Miguel, teve a identidade preservada e foi parcialmente responsabilizada pela morte da criança.

Como previsto em lei, ela pagou fiança - determinada pelo delegado Ramón Teixeira em R$ 20 mil - e foi liberada. As primeiras investigações apontaram que a mulher teria permitido que o garoto subisse sozinho no elevador antes de cair do 9º andar - uma altura de 35 metros.

De acordo com a polícia, as imagens das câmeras de segurança foram a principal prova da "negligência" da mulher, como a polícia definiu. No entanto, a investigação descartou qualquer relação da moradora com a queda da criança e o que provocou a sua morte.

>>Empregada doméstica, mãe de Miguel, consta como funcionária da Prefeitura de Tamandaré

Confira a íntegra da entrevista com a mãe de Miguel

TV Jornal: Mirtes, a gente sabe que é um momento difícil. Qual o sentimento hoje?

Mirtes: O sentimento que prevalece em mim é dor. Dor pela perda do meu filho, e só. Não sinto raiva, ódio, depois que vi os vídeos, não. Só sinto uma dor muito forte no peito. Meu coração está sangrando pela perda da minha vida. Do amor da minha vida.

TV Jornal: Como era Miguel?

Mirtes: Miguel era uma criança extrovertida, extremamente feliz. Como criança ele tinha tudo, eu dava educação, saúde, vestuário, o que fosse necessário para o meu filho, eu dava. Eu deixava faltar para mim, mas para ele não deixava faltar nada. E tinha planos para o futuro dele. Mas infelizmente os planos do futuro para o futuro do meu filho foram interrompidos.

TV Jornal: Mirtes, você sabia que o Miguel estava no elevador no momento desse incidente?

Mirtes: Não. Quando eu saí do apartamento, eu deixei ele dentro do apartamento. Antes de sair, disse para minha patroa que não iria levar as crianças para passear com a cadela porque eles aperrearam. Eu disse que, por não terem se comportado, eu não iria levar. E, se depois eles obedecessem, de tardezinha eu levaria.

A menina (a filha dos patrões) se conformou, mas meu filho não se conformou, ficou chorando. Ela disse que eu fosse, que ela ficaria com Miguel

TV Jornal: Quem era a menina?

Mirtes: A filha da minha patroa.

TV Jornal: Eles costumavam brincar juntos quando você estava trabalhando?

Mirtes: Sim, sim, eles tinham um bom convívio, brincavam bastante. Normal de criança, brincar, aperrear...

TV Jornal: Pelas imagens, dá para perceber que a patroa foi até o elevador; ela teria saído do apartamento e ido ao elevador. Você tinha ciência disso?

Mirtes: Tinha. Que ela foi atrás de Miguel. Ontem, quando eu vi o vídeo, entendi o motivo da revolta que houve no velório do meu filho. Antes disso, eu não tinha visto nada. Porque quando eu estava na delegacia e os vídeos chegaram, eu não quis ver porque não estava em condições de ver nada

TV Jornal: Diante das imagens que você viu, você tirou alguma conclusão?

Mirtes: A conclusão que eu tirei é que, infelizmente, faltou um pouco de paciência dela para tirar meu filho de dentro do elevador. Se ela tivesse tido um pouquinho de paciência, tivesse pegado ele pela mão, antes de ficar só falando, meu filho hoje estaria comigo.

TV Jornal: Você me falou que ele costumava passar alguns dias numa casa de praia em Tamandaré. Ele teria chegado essa semana. Ele passou na sua casa, inclusive, você até mostra aqui uma bicicleta que ele gostava muito de brincar.

Mirtes: Ele gostava muito, ele estava com saudade da bicicleta dele.

TV Jornal: Vocês chegaram na segunda e, antes de ir para o apartamento na terça, ele passou aqui para brincar um pouco.

Mirtes: Na segunda-feira quando ele passou aqui, o pneu tava murcho, a gente passou na casa da vizinha, ela encheu o pneu dele, e ele ficou durante a noite na rua brincando, com os amigos dele na rua.

TV Jornal: (À Marta, avó de Miguel): Seu filho-neto, seu único neto, que a senhora tinha como filho. O que a senhora está sentindo nesse momento, o que é que a família mais quer agora?

Marta: Eu estou sentindo muita dor. É dor. Meu coração esta sangrando. E tudo que eu quero é só justiça. Só justiça mesmo.

TV Jornal: Mirtes, em relação ao boletim de ocorrência, você está com ele? Foi entregue à você?

Mirtes: Não me entregaram o boletim de ocorrência. Eu assinei três vias e não me entregaram nada. Só me pediram para aguardar do lado de fora, que dois policiais iriam me trazer em casa. Foi o que fizeram, a mim não me entregaram nada.

TV Jornal: Agora é só esperar.

Mirtes: Agora é só esperar, pela Justiça de Deus e do homem.

O acidente

De acordo com o perito André Amaral, as imagens do circuito interno de segurança mostram que a criança saiu do quinto andar, entrou no elevador sozinho e subiu até o nono andar. Lá, ele teve acesso ao hall de serviço onde fica o condensador de ar condicionado. Ainda segundo o perito, o menino teria escalado o guarda peito de metal e caiu de uma altura de 35 metros. “Tinha marca de sandália e caracteriza de 1,20 m que é a altura da vítima”, disse. “Na área de acesso lá [no 9º andar], a janela estava aberta, não tinha nenhuma proteção, qualquer pessoa tem acesso, mas não era uma coisa comum ter um acesso a uma criança naquele trecho (...) Verificamos que se trata de uma natureza acidental”, completou. Testemunhas relataram que o menino estava procurando a mãe, ainda conforme o perito.

O corpo da vítima foi liberado do Instituto de Medicina Legal (IML) na manhã desta quarta-feira (3) e o sepultamento aconteceu nesta tarde no cemitério de Bonança, distrito de Moreno, cidade da Região Metropolitana do Recife.

Depoimentos

A mãe de Miguel prestou depoimento na Delegacia de Santo Amaro, ainda na terça-feira. Os patrões dela também foram ouvido, além de um representante da empresa que instalou as câmeras de segurança do prédio.

Após ser ouvida, Mirtes foi levada para a casa de familiares em Jaboatão dos Guararapes. Os donos do apartamento saíram horas depois. Eles montaram um esquema para deixarem a delegacia em dois carros e não responderem às perguntas da imprensa.

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