Luto

Morre, aos 87 anos, o comentarista Luis Cavalcante

Davi Saboya
Davi Saboya
Publicado em 03/11/2017 às 20:14

-Reprodução

O dia 3 de novembro de 2017 será a data em que a crônica esportiva não terá como abalizar as palavras à altura do radialista Luis Cavalcante, que faleceu aos 87 anos, no Hospital Albert Sabin, Ilha do Leite. Baiano de origem, pernambucano de coração, “Seu Luis” ficou conhecido como o comentarista da palavra abalizada. As informações são do JC Online.

Foram 60 anos dedicados ao rádio esportivo, desde 1955 em Pernambuco. Luis Cavalcante teve cinco passagens pela Rádio Jornal, totalizando 34 anos de dedicação à casa. Diabético, ele lutava contra câncer de pulmão. Deixou a esposa, dois filhos, seis netos e seis bisnetos.

História

Nascido em Ilhéus, no interior da Bahia, Luis Cavalcante começou na Rádio Cultura, da cidade natal, no dia 28 de novembro de 1952, como narrador. Na época, os jogos eram transmitidos por dois profissionais. "Eu quis fugir, mas ficou todo mundo olhando para minha cara e fiquei ali. A narração em dupla, cada um ficava com um lado do campo. Quando a bola passou para o meu lado, travou a garganta e não consegui. Fiquei com raiva de mim mesmo e disse: vou narrar. E narrei. Foram quase três anos lá", afirmou Seu Luis em entrevista ao documentário produzido pelos jornalistas André Fontes e Ricardo Baroni.

Em 1955, Lula, como era chamado pelos mais íntimos, desembarcou no Recife para assumir a função de narrador na Rádio Olinda. Cargo em que permaneceu por quase duas décadas, mas depois tornou-se comentarista e eternizou o nome na profissão. Ganhou a nomeclatura de "comentarista da palavra abalizada" após a chegada na Rádio Jornal no ano de 1965.

O bordão não era à a toa. Ninguém contestava os comentários de Luis Cavalcante. Tanto por parte dos profissionais da crônica esportiva como os demais que formavam o mundo do futebol. "Quando eu circulava muito pela cidade, andava pelas três torcidas. As pessoas me paravam para falar, traziam o filho para tirar foto... sempre tive um bom relacionamento com todo mundo: jogadores, diretores e companheiros de profissão", disse o radialista. "Essa meninada toda gosta de mim, me trata bem", acrescentou em referência aos jovens jornalistas esportivos.

De 1966 a 1972, Seu Luís foi o presidente da Associação de Cronistas Desportivos de Pernambuco (ACDP) e ficou marcado na entidade. Foi o responsável pela compra das salas em que funciona o órgão na Rua Solimões, no bairro do Santo Antônio, pelo valor de 10 milhões de cruzeiros (moeda da época), que foi obtido após a realização de um torneio amistoso com Náutico, Sport, Santa Cruz e América.

Do Trio de Ferro de Pernambuco, Lula acompanhou o auge das décadas de ouro. O hexacampeonato estadual do Náutico em 60. Período em que o Timbu disputou de igual para igual com o Santos, de Pele e Coutinho, o Palmeiras, de Ademir de Guia, entre outras pontencias nacionais. O pentacampeonato do Santa Cruz na década seguinte com craques corais à nível nacional como Givanildo Oliveira e Ramon. A grande disputa nos anos 80. E hegemonia do Sport no final do século 20 com a geração de Leonardo, Chiquinho e Juninho Pernambucano.

Com seis Copas do Mundo no currículo, Luis Cavalcante cobriu um mundial de seleções pela primeira vez em 1974 na Alemanha. Na ocasião, o comentarista da palavra abalizada foi convidado pelo governo alemão para cobrir a competição com todos os custos pagos. Quatro anos depois da Seleção Brasileira conquistar o tricampeonato com Pelé, Garrincha e Nilton Santos. "Eu narrei a fase áurea de Pelé e coutinho no Santos, Garrincha e Nilton Santos no Botafogo. Eles e muitos outros projetaram o futebol brasileiro para o mundo", pontuou o cronista. A última edição que teve a honra de receber Seu Luis foi em 1998 na França. Escolhida a dedo por ele para encerrar as longas viagens na capital Paris, que o atrai bastante.

Mas se engana quem pensa que Luis Cavalcante era só futebol. Com rico vocabulário e vasto repertório cultural, Seu Luís era um amante do frevo. Dono dos títulos de cidadão recifense, dado pela Câmara Municipal, e cidadão pernambucano, entregue pela Assembléia Legislativa, ele, ao lado de outros compositores, foram os autores de um frevo canção e um frevo de bloco. "Vamos parar por aqui porque se não vamos ser conhecidos como o Vasco da Gama do Futebol. Vice, vice, vice (risos)", comentou o eterno dono da palavra abalizada após a sequência de festivais em que as músicas terminaram em segundo lugar.

A importância de Lula para a crônica esportiva de Pernambuco e Brasil era tão grande, que despertou o interesse do jornalista Jota Alcides em escrever sobre a história dele. "O Mestre da Bola no Ar" foi lançado em 2014 no Recife.