SAÚDE

Veneno de peixe pode ajudar no tratamento da asma, aponta estudo brasileiro

A substância com propriedades anti-inflamatórias foi descoberta em 2007 por pesquisadoras do Instituto Butantan

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Marcelo Aprígio

Publicado em 24/08/2023 às 11:24 | Atualizado em 24/08/2023 às 11:52
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Um estudo realizado por pesquisadoras do Laboratório de Toxinologia Aplicada (Leta) do Instituto Butantan descobriu que um derivado do veneno do peixe niquim pode ajudar no tratamento da asma.

Segundo a pesquisa, o peptídeo patenteado TnP é um potencial aliado ao tratamento da doença respiratória.

A substância com propriedades anti-inflamatórias foi descoberta em 2007 pelo grupo de pesquisa das imunologistas Carla Lima e Mônica Lopes Ferreira. 

Depois, deu-se origem a uma série de peptídeos sintéticos produzidos pelo grupo, que foram patenteados no Brasil e em outros 12 países. Desde então, pesquisas conduzidas pela equipe têm apontado a molécula como uma possível candidata para tratar doenças inflamatórias crônicas imuno-mediadas. 

No trabalho atual, as cientistas compararam grupos de animais com asma tratados com TnP e com dexametasona, fármaco comumente utilizado para tratar a doença, e animais não tratados.

Assim como o tratamento convencional, o TnP reduziu em mais de 75% o número de células totais que causam inflamação e dano tecidual no pulmão.

No caso dos eosinófilos, responsáveis pela inflamação em cerca de metade dos pacientes com asma, a redução foi de 100%.

O tratamento com TnP também impediu a remodelação das vias aéreas e reduziu o aumento do número de células brônquicas produtoras de muco, fundamental para aliviar os sintomas da asma, como a redução da função pulmonar e obstrução do fluxo aéreo. 

SEM EFEITOS ADVERSOS

Além disso, não foram identificados efeitos adversos – diferente das terapias convencionais, que podem causar sintomas como taquicardia, agitação, dor de cabeça e tremores musculares. 

“Nós submetemos o veneno do peixe a uma cromatografia para identificar peptídeos e testamos várias moléculas. Essas toxinas provocam dor, edema, necrose. Até que chegamos a uma fração de peptídeos que não causava nenhuma ação danosa e isso nos chamou atenção. Esse tipo de descoberta é o outro lado da moeda”, diz a pesquisadora Mônica Lopes-Ferreira, responsável pelo estudo. 

O passo seguinte foi fazer o sequenciamento do TnP para identificação da sua estrutura e permitir a produção dos peptídeos sintéticos em laboratório – assim, as pesquisadoras não dependem mais da extração do veneno do peixe e podem testar as moléculas sintéticas em diferentes modelos de doenças.

Em estudo pré-clínico anterior, publicado em 2017 na revista PLOS One, a molécula TnP também apresentou potencial contra a esclerose múltipla, atrasando o aparecimento dos sintomas e reduzindo a gravidade da doença em camundongos. A próxima etapa, segundo Mônica, é testar o tratamento em modelos de doenças oculares. 

DESCOBERTA SEGURA

Para avaliar a toxicidade e segurança do peptídeo TnP, a equipe liderada por Mônica testou a molécula em zebrafish (ou peixe paulistinha), um modelo animal de pesquisa toxicológica pré-clínica que apresenta 70% de semelhança genética com humanos.

Não houve registro de disfunções cardíacas nem problemas neurológicos causados pelo peptídeo após atravessar a barreira hematoencefálica. 

VENENO DE PEIXE

O veneno do peixe niquim é estudado pelo Butantan desde 1996. Trata-se de um peixe peçonhento brasileiro que predomina nas regiões Norte e Nordeste do país.

A espécie costuma se esconder em buracos na areia e é capaz de sobreviver por até 18 horas fora d’água, podendo provocar acidentes graves. O contato com seus espinhos causa dor aguda, sensação de queimação, inchaço e necrose.

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