O desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco Alexandre Guedes Alcoforado Assunção autorizou a igreja “Família 61”, localizada no bairro de Boa Viagem, Zona Sul do Recife, a realizar cultos presenciais.
A decisão do magistrado contraria o decreto estadual que impede atividades não essenciais de funcionarem entre os dias 18 e 28 deste mês de março.
Para o governo de Pernambuco, igrejas não são serviços essenciais. A decisão de Alcoforado é liminar e, portanto, pode ser derrubada. A liberação do desembargador também não se aplica a outras igrejas.
A decisão que autoriza o culto presencial foi tomada nessa sexta-feira (19). O magistrado analisou um mandado de segurança impetrado pelo pastor da igreja, identificado como Arthur de Araújo Neves Neto.
No pedido para celebrar cultos presenciais, o pastor disse que “teve cerceado seu direito líquido e certo de liberdade e consciência e de crença, tais como ações sociais"
Essas ações são: "atendimento pastorais, prestar assistência religiosa aos fiéis num momento de tão grave pandemia, pregar o evangelho, realizar cultos presenciais, e nem exercer nenhuma de suas atividades sacerdotais”.
Segundo ele, o decreto estadual tem arbitrariedades e ilegalidades.
Ao analisar o pedido, o desembargador defendeu que o decreto estadual impede o livre exercício de cultos religiosos e classificou o impedimento como uma “afronta a preceito constitucional pétreo”.
“O livre exercício de cultos religiosos, como manifestação da liberdade religiosa, está expressamente assegurada, prevendo o dispositivo “... proteção aos locais de cultos e suas liturgias”.”, escreveu Alcoforado.
Por fim, o magistrado garantiu ao pastor o “pleno exercício de seu mister sacerdotal, podendo, para tanto, presidir cultos presenciais e exercer quaisquer atividades religiosas.
Para isso, precisam ser "observadas as regras sanitárias estabelecidas pelas autoridades governamentais para contenção da pandemia da COVID-19”.
De acordo com apuração do Blog de Jamildo, a Procuradoria-Geral do Estado vai recorrer da decisão.
Ao Jornal do Commercio, a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de Pernambuco reforçou que a decisão é válida apenas para o pastor Arthur de Araújo Neves Neto.
Portanto, outros pastores precisariam de autorizações semelhantes para, igualmente, poderem realizar cultos presenciais.
Questões polêmicas e contestadas por especialistas
Na decisão que autoriza o pastor Arthur de Araújo Neves Neto celebrar cultos religiosos na igreja Família 61, o desembargador Alexandre Alcoforado fez observações polêmicas e imprecisas sobre a pandemia.
Ele defendeu, por exemplo, um “tratamento precoce” para a doença. Entretanto, até o momento, não há nenhum medicamento com o poder de prevenir a infecção ou agravamento da doença.
O uso de medicamentos como a Ivermectina e a Cloroquina, por exemplo, são amplamente desaconselhados pelos principais especialistas da área médica do mundo.
Sem apresentar nenhuma comprovação científica, Alcoforado escreveu que “Tratamento precoce evita a piora da doença”, acrescentando que, com relação ao tratamento precoce, a ação estatal “está deficiente”.
Na avaliação do magistrado, o Estado tem “a obrigação de colocar à disposição dos médicos todos os medicamentos que o profissional entender necessário para a cura do paciente".
"Ressalte-se que os medicamentos muito utilizados na fase precoce são de baixo custo e com larga utilização para outros eventos”, disse.
Na verdade, medicamentos como a Ivermectina e a Cloroquina, não têm nenhuma comprovação de que ajudam no tratamento da covid-19.
No caso da Ivermectina, por exemplo, trata-se de um medicamento usado para o tratamento de piolho.
Além disso, recentemente, uma médica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte disse que 90% dos pacientes internados com covid-19 no Estado tomaram Ivermectina.
Lockdown
O magistrado também foi impreciso em uma referência ao que a Organização Mundial da Saúde fala sobre o processo de Lockdown. Na decisão dessa sexta-feira, Alcoforado disse:
“O lockdown tem sido adotado em praticamente todo o mundo, mas seus resultados são bastante questionáveis, revelando-se cruel nos países pobres e em desenvolvimento".
Segundo ele, isso teria levado "a Organização Mundial de Saúde - OMS reconhecer que não deveria ser adotado nesses países”.
Diferente do que o magistrado escreveu, a OMS reconhece a importância do Lockdown para frear a taxa de transmissão do vírus.
O que os diretores da OMS não defendem é que lockdown seja a única medida usada para combater a pandemia. Recentemente, em entrevistas à Rádio Jornal, a tese foi confirmada por especialistas no assunto.
O ex-presidente da Anvisa, o médico sanitarista Gonzalo Vecina, esclareceu que, em momentos em que a curva de casos esteja ascendente, um lockdown pode ser mais efetivo até mesmo que vacinas.
Na mesma linha, o diretor-adjunto da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o médico pernambucano Jarbas Barbosa, disse que medidas como o lockdown “são duras, mas são a única forma de salvar vidas”.