
Com informações da Agência Senado
Apesar do número de contágios pelo novo coronavírus ter aumentado, o início de 2021 no Brasil foi marcado pelo fim da vigência do decreto de calamidade pública.
O Congresso Nacional havia aprovado o estado de calamidade pública em 20 de março de 2020, em função da emergência sanitária causada pela pandemia de covid-19.
Gastos
Com o fim do decreto, o Estado brasileiro agora possui menos recursos disponíveis para financiar políticas de assistência social, ações emergenciais na saúde e no setor produtivo. Tais recursos estavam atrelados ao fim desse prazo, estabelecido em 31 de dezembro de 2020.
O reconhecimento do estado de calamidade pública permite ao governo aumentar os gastos públicos e descumprir a meta fiscal prevista para o ano. Em 2020, o Orçamento admitia um déficit fiscal de até R$ 124,1 bilhões.
Por conta da pandemia, o déficit passou para R$ 831 bilhões. A liberdade com os gastos deu permissão ao governo para ampliar as despesas com o Bolsa Família.
Também foi possível garantir o repasse de recursos para o pagamento do auxílio emergencial e direcionar valores extras para a compra de medicamentos e insumos.
Segundo dados do Siga Brasil, o decreto de calamidade pública permitiu destinar, até dezembro de 2020, R$ 513,19 bilhões para gastos como:
- auxílio emergencial (R$ 230,7 bi);
- benefício emergencial de manutenção do emprego e renda (R$ 33,48 bi);
- auxílio financeiro aos estados e municípios (R$ 63,15 bi), entre outras despesas.
Orçamento de Guerra
Com o fim do prazo, o Orçamento de Guerra (EC 106/2020), previsto para ser extinto junto ao estado de calamidade pública, também perdeu sua validade no dia 1º de janeiro.
A Emenda Constitucional criou um regime extraordinário fiscal que deu permissão ao Banco Central para comprar títulos de empresas privadas no mercado secundário, com o objetivo de garantir liquidez ao mercado de capitais.
Além disso, a medida também permitiu processos mais rápidos para compras, obras e contratações de pessoal temporário e serviços.
Medidas emergenciais
Outras iniciativas atreladas à vigência do estado de calamidade pública estão inseridas na Lei nº 13.979, de 2020.
Este é o caso dos artigos que permitiam prazos reduzidos pela metade na licitação pela modalidade pregão eletrônico ou presencial, para a compra de material relacionado ao combate à covid-19.
Também deixaram de ter validade os dispositivos que previam:
- a comunicação obrigatória e imediata de possível contaminação pela doença por parte dos cidadãos;
- a manutenção da validade de receitas de remédios sujeitos à prescrição; e
- a determinação de que o Ministério da Saúde deveria manter dados públicos e atualizados sobre os casos confirmados de covid-19, suspeitos e em investigação.
Vacina
Por outro lado, continua valendo o dispositivo que prevê a autorização da Anvisa de 72 horas para importação e distribuição de vacinas aprovadas por órgão estrangeiro (Lei 13.979).
A razão para isso é a extensão da vigência, por parte do ministro Ricardo Lewandowski do Supremo Tribunal Federal (STF), de alguns dispositivos que estavam vinculados ao decreto.
A decisão, proferida em 30 de dezembro de 2020, também estende a validade de medidas que podem ser adotadas pelas autoridades durante a pandemia, como:
- isolamento e quarentena;
- uso de máscaras;
- determinação de realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas.
A decisão de Lewandowski ainda será analisada pelo plenário do STF, mas, enquanto isso não ocorre, a determinação do magistrado segue valendo.
Setor cultural
Artistas e trabalhadores da cultura também devem ser afetados pelo fim do decreto. Desde 1º de janeiro, esses profissionais deixaram de receber o auxílio emergencial de R$ 600 definido pela Lei Aldir Blanc (Lei 14.017/2020).
A legislação direcionou parte dos R$ 3 bilhões destinados ao setor para a área de cultura dos estados e municípios para financiar a manutenção de empresas e de espaços artísticos e culturais, como teatros, escolas de música e dança, circos e bibliotecas comunitárias.
Ainda em dezembro, o presidente da República, Jair Bolsonaro, assinou uma medida provisória (MP 1019/2020) para permitir a aplicação, em 2021, dos recursos de R$ 3 bilhões já assegurados pelo governo federal e ainda não utilizados por estados e municípios.
Eventos e turismo
Regras estabelecidas pela Lei 14.046, de 2020, também perderam a validade. A norma tratava do adiamento ou cancelamento de eventos, serviços ou reservas nos setores de cultura e turismo por conta da pandemia de covid-19.
O texto estabelecia que, caso o evento, serviço ou reserva já feitos, até 31 de dezembro de 2020, fossem adiados ou cancelados, incluindo shows e espetáculos, a empresa vendedora ficaria desobrigada a reembolsar o consumidor.
Isso desde que assegurasse a remarcação do evento, serviços ou reservas, ou disponibilizasse um crédito para uso ou abatimento na compra futura para outros eventos, serviços ou reservas.
Contratos de trabalho
O fim do estado de calamidade pública interrompe também a validade das medidas previstas na Lei 14.020, de 2020. Assim, as empresas não podem mais adotar redução proporcional de jornada/salário e/ou suspensão temporária de contrato de trabalho de seus empregados.
Isso porque a legislação vincula a flexibilização dessas regras trabalhistas ao período de calamidade estabelecido pelo decreto.
Aviação civil
Entre as regras que perderiam efeito a partir do dia 1º de janeiro estão as que estabelecem condições excepcionais para reembolso e remarcação de passagens aéreas.
Mas com o aumento de casos de covid-19 e a possibilidade de novos cancelamentos de voos e passagens, o governo decidiu editar uma Medida Provisória (MPV 1.024/2020) para prorrogar até 31 de outubro de 2021.
Foram mantidos os mesmos critérios definidos anteriormente pela Lei 14.034, de 2020: prazo de 12 meses, contado da data do voo cancelado, observada a atualização monetária calculada com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
Com a Medida Provisória , o consumidor continua com direito a cancelar o voo contratado devido a imprevistos da pandemia.
Calamidade nos estados
Frente às incertezas do cenário epidemiológico, do aumento no contágio e o reflexo da pandemia na economia e nas unidades de saúde dos estados e municípios, nove governadores decidiram estender o prazo do estado de calamidade pública em seus estados.
Entre os estados que decidiram pela prorrogação estão: Pernambuco, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Piauí, Roraima, Paraná, Rondônia, Tocantins e o Distrito Federal. A maior parte deles foram estendidos até o meio do ano.
Prorrogação do estado de calamidade pública no país
Os governadores dos estados também atuam em outra frente, pressionando o governo federal a prorrogar o decreto de calamidade pública através de medida provisória.
Em reunião com representantes do Executivo, ainda em dezembro, governadores apelaram para a renovação do decreto por mais seis meses para dar agilidade à compra e validação de vacinas. Contudo, não há nenhum posicionamento oficial do governo de Jair Bolsonaro sobre o assunto.
Prorrogação via Legislativo
Sem previsão de prorrogação do decreto de calamidade pública por parte do Palácio do Planalto, senadores apresentaram Projetos de Lei com o objetivo de estender o pagamento do auxílio emergencial.
Este é o caso, por exemplo, do PL 5.495/2020, dos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Esperidião Amin (PP-SC).
Segundo a proposta, o valor do auxílio seria de R$ 300 ou R$ 600, de acordo com a condição do beneficiário, com vigência até o final de 2021, quando teria fim o novo prazo para o estado de calamidade.
Já o senador Weverton (PDT-MA), apresentou o Projeto de Decreto Legislativo (PDL 1/2021) para estender o estado de calamidade pública por mais 180 dias.
O texto autoriza o governo a ter gastos extras na área de saúde para compra, distribuição e aplicação da vacina e também possibilita a prorrogação do auxílio emergencial de R$ 600,00 conforme as regras já estabelecidas pela lei anterior.
Caso o decreto seja prorrogado — por medida provisória ou alguma proposta em tramitação no Congresso —, o funcionamento da comissão mista que acompanha as medidas do governo contra a crise será prorrogado automaticamente.
A informação foi dada pela vice-presidente do colegiado, senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), no momento em que o relatório final apresentado pelo grupo foi aprovado, em 18 de dezembro.
“Em havendo a prorrogação do estado de calamidade, automaticamente, a comissão também tem sua prorrogação, porque, constitucionalmente, ela precisa acontecer mediante a continuidade ou não do estado de calamidade pública”, afirmou.
“Mas, como todos nós sabemos, infelizmente a pandemia não acabou ainda. Estamos possivelmente vivendo aí uma segunda onda, com crescimento dos casos de morte e também de contração do vírus pela população brasileira", concluiu a senadora.