TRAGÉDIA

Quem são as vítimas das chuvas em Pernambuco?

Conheça histórias dos atingidos pela grande tragédia no Estado

Catêrine Costa
Catêrine Costa
Publicado em 30/05/2022 às 17:36 | Atualizado em 27/06/2022 às 15:59
Notícia
Reprodução/TV Jornal
Chuvas em Pernambuco deixou mortos e desabrigados. Conheça histórias pela tragédia - FOTO: Reprodução/TV Jornal

As consequências das fortes chuvas que caíram na Região Metropolitana do Recife (RMR) e zonas da Mata Norte e Sul de Pernambuco só aumentam a cada hora. 

De acordo com dados do Governo do Estado, até o momento, já foram registradas 106 mortes e 10 desaparecidos 

Segundo balanço divulgado pela Central de Operações da Codecipe na manhã desta segunda-feira (30), cerca de seis mil pessoas estão desabrigadas por conta das chuvas que têm atingido Pernambuco.

Essas pessoas são vítimas de uma tragédia anunciada. Não são apenas vítimas das chuvas.

Famílias que moram em áreas de riscos não vivem nessas situações por opção. Moram em morros por consequência de uma sociedade que aceita cidadãos sem direito à cidadania plena.

Que aceita que seres humanos morram sufocados pela terra que apoiava suas casas e impede que indivíduos possam acessar sua residências sem que morram afogados pelo descaso.

PRIMEIRAS VÍTIMAS DAS CHUVAS NO GRANDE RECIFE

As fortes chuvas no Grande Recife começaram na noite da última terça-feira (24). Com elas, vieram as primeiras tragédias. 

A primeira vítima confirmada foi o idoso, de 62 anos, José Cláudio da Silva. Ele morava sozinho em uma casa no Córrego do Abacate, no bairro de Águas Compridas, em Olinda, quando uma barreira desmoronou. 

Próximo a casa de seu José, no bairro de Caixa D'água, morava o casal Rosimere Hipólito da Silva, de 44 anos, e Sérgio Pimentel, de 54 anos, que também foram vítimas de deslizamento de barreira. 

Os bombeiros levaram mais de 24h para encontrar os corpos das vítimas, que só foram localizados na manhã da última quinta-feira (26). 

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Casal foi encontrado hoje (26) - Reprodução/ TV Jornal

A poucos quilômetros dali, na madrugada da quarta-feira (25), Aureogildo Vasconcelos, de 36 anos, voltava de uma pelada no bairro de Jardim Brasil. 

Gildo, como era conhecido, também era ex-jogador de futebol profissional. Ele trafegava de motocicleta na Avenida Presidente Kennedy, no bairro de Peixinhos, Olinda, quando foi puxado pela água e caiu no Canal Lava Tripa.

Divulgação
O corpo foi encontrado na tarde de hoje (26) - Divulgação

A motocicleta foi encontrada por populares na manhã do mesmo dia. O corpo dele foi encontrado na tarde da quinta-feira (26), no bairro de Cajueiro, já no Recife, pelo irmão da vítima e alguns amigos.

Veja vídeo do resgate da moto:

Mesmo Gildo tendo desaparecido na madrugada da quarta-feira (25), o Corpo de Bombeiros de Pernambucoiniciou as buscas na manhã da quinta.

Foi informado à imprensa e a familiares da vítima que: "os Bombeiros estiveram no local, avaliaram o cenário da ocorrência e informaram que quando o nível da água baixar é que as buscas poderão ser realizadas".

Na manhã da sexta-feira (27), mais uma morte foi confirmada. 

Dessa vez, foi encontrado o corpo do jardineiro Alex Rodrigo da Luz, 41 anos, que estava desaparecido desde a quarta-feira (25).

Arquivo pessoal
O jardineiro Alex Rodrigo da Luz mora no bairro da Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes. - Arquivo pessoal

O corpo estava próximo ao local onde ele desapareceu, no bairro da Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes.

Ele morreu afogado enquanto tentava salvar seus animais, que criava no sítio em que morava. 

MORTOS PELAS CHUVAS NO GRANDE RECIFE

Um número triste de uma tragédia anunciada: já são 106 vidas acabadas e mais 10 pessoas seguem desaparecidas.

Entre os mortos, há bebês de colo, crianças, idosos e famílias inteiras

O mecânico Edson Souza é parente da jovem Taís Lucia Oliveira, de 22 anos, vítima do deslizamento de barreira que atingiu o Jardim Monte Verde, em Jaboatão dos Guararapes.

Beatriz, a filhinha de Taís, tinha apenas 1 ano e 8 meses e também perdeu a vida no último sábado (28).

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Taís Lucia Oliveira, de 22 anos, e a filha Beatriz, de 1 ano e 8 meses. - Reprodução/Instagram

"Na verdade, isso não é uma tragédia. Isso é uma chacina. Porque todos os anos isso acontece, sendo que não tinha acontecido ainda nessa proporção. E isso, infelizmente, está longe de mudar

Edson também relata que houve um descaso do Estado com a população que reside em áreas de risco. 

"O povo constrói casa em barreira, porque não tem onde morar. É a necessidade. O governo não dá suporte ao povo para uma moradia digna. Ainda tem gente que diz: 'É perigoso fazer casa em barreira, e o povo faz'. Ou paga o aluguel ou come, essa é a realidade do pobre", disse. 

Tiago José da Silva conta, com lágrimas nos olhos, como perdeu a mãe Auderice de 62 anos, a esposa Jaidete de 40 anos e os dois filhos: Hadassa, de 2 anos, e Felipe de 4 anos: 

"Começou a chover, e minha esposa pediu para que eu saísse e pegasse uma enxada para desviar a água. Quando eu saí, a casa caiu com todo mundo. Saiu derrubando tudo. Parecia uma avalanche. Tá difícil de se levantar, mas tem que se reerguer."

Edson Tomé da Silva, o pai de Artur Tomé da Silva (19), perdeu o filho no sábado (28).

Artur foi resgatado pelos próprios moradores da Guabiraba, mas acabou falecendo.

A esposa e os dois filhos da vítima permanecem hospitalizados.

"A casa não oferecia risco, era muito longe da barreira. Mas o peso do entulho era grande e arrastou a casa. Ele (Artur) estava em casa com a esposa e com os filhos, um de 10 anos e um de 4 meses de vida. Todos foram arrastados", disse Edson.

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Artur Tomé da Silva, de 19 anos, foi resgatado pelos próprios moradores da Guabiraba, mas acabou falecendo. - Reprodução/TV Jornal

"A esposa dele e os filhos foram encontrados primeiro e não vieram a óbito. Ele foi encontrado com vida ainda pelos moradores, porque os bombeiros não tinham chegado ainda. Mas ele não sobreviveu", finaliza.

A avó do bebê de 10 meses, Antoni Miguel, que perdeu a vida embaixo dos escombros, Érika, tentou reunir forças para explicar como tudo aconteceu:

"Ela (a mãe da criança) escutou a irmã do meu genro dizendo que a barreira estava caindo. Ela estava na cozinha e correu para pegar o bebê. Só sentiu os escombros. Ficou toda coberta, só estava com a perna para fora. Meu genro também foi atingido, e o sobrinho dele de 5 anos ficou só com a cabeça para cima."

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Bebê de 10 meses perdeu a vida sob os escombros - Reprodução/ TV Jornal

"Quando conseguiram tirar todo mundo, começaram a procurar pelo bebê. Isso ainda pela manhã. Acharam o corpo dele às 15 horas da tarde. Mas quando ele chegou ao hospital, o médico disse que ele já estava morto há cerca de uma hora", disse.

No início da noite de domingo (29), os bombeiros localizaram o corpo de Andreza Fragoso da Silva, 30 anos.

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Andreza Fragoso da Silva, 30 anos. - Divulgação

Ela estava soterrada a 50 metros da casa dela. Após uma hora, o corpo foi retirado da terra. A equipe do Corpo de Bombeiro encontrou na tarde desta segunda-feira (30) o corpo do marido de Andreza.

"Se o Governo e a Prefeitura fizessem alguma coisa, isso não acontecia todos os anos. Todo ano é família enterrando entes queridos. Isso não muda. Não sei se depois desse caso, que foi muito grande, eles vão tomar uma providência em relação a isso", diz Edson Souza, parente de Taís.

Em Camaragibe, moradores tentavam retirar da área de risco Mauro Jorge Cardoso, 60 anos. Mas não conseguiram chegar a tempo. Antes do aviso, a barreira deslizou caiu sobre a casa que do idoso fazendo com que ele se tornasse mais uma vítima de soterramento. 

O corpo dele foi retirado pela própria população.

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Mauro Jorge Cardoso, 60 anos, mais uma vítima das chuvas em Pernambuco. - Reprodução/ TV Jornal

VÍTIMAS DAS CHUVAS EM PERNAMBUCO

A equipe de reportagem da TV Jornal relembra o nome e idade de algumas das 91 vítimas, vidas que se foram. 

1. Anderson Nascimento de Aguiar, 26 anos
2.  Antoni Miguel, 10 meses
3. Artur Tomé da Silva, 19 anos
4. Francisca Estevão dos Santos, 63 anos
5.  Hadassa Lima da Silva, 2 anos
6.  Richarlison Nascimento Aguiar, 12 anos
7. Sérgio Pimentel, de 54 anos
8. Alex Rodrigo da Luz, 41 anos
9. Andreza Fragoso da Silva, 30 anos
10. Andreza karla do nascimento aguiar
11. Antony Miguel de Souza Silva, 10 meses
12. Aureogildo Vasconcelos, de 36 anos
13. Beatriz Santos da Silva, 1 ano e 8 meses
14. Dona Nalva (não informaram idade)
15. Elisangela da Silva Rocha, Idade: NÃO INFORMADO
16. Elize Beatriz Souza dos Santos, 1 ano e 04 meses
17. Emile Marques da Silva, 5 anos
18. Fabio da silva aguiar
19. Francisca da silva aguiar
20. Helena Beatriz Bezerra dos Santos, 04 anos
21. Ivandeque Carlos de Lima, 47 anos
22. José Cláudio da Silva, 62 anos
23. José da silva aguiar
24. José Estevão de Aguiar, 72 anos
25. Kaique Marques da Silva, 7 anos
26. Leandro Severino, 37 anos
27. Lucas ricardo aguiar - 10 anos
28. Marcele Vitótia, 3 meses
29. Maria Jose Gomes da Silva, 82 anos
30. Maria Vandeilza Ramos de Aguiar, 58 anos
31. Marize Maria de Souza Silva, 43 anos
32. Mauro Jorge Cardoso, 60 anos
33. Raissa Marize Bezerra de Souza,24 anos
34. Rayonara Ribeiro de Oliveira, 30 anos
35. Richardison candido da silva junior- 11 anos
36. Rosenilda Maria de Oliveira da Silva, 42 anos
37. Rosimere Hipólito da Silva, de 44 anos
38. Rumany da Silva Júnior - 8 anos
39. Ruth Soares de 44 anos
40. Tais Feitosa, 31 anos
41. Thais Thayane Soares dos Santos, 13 anos
42. Thays Lucia Oliveira da Silva, 21 anos
43. Vandeck ( foi ajudar e morreu, barreira deslizou)
44. Victor Henrique Silva de Lima, 1 ano
45. Wesley, 26 anos
46. Wildilane, 26 anos

 

De acordo com a UPA do bairro do Ibura, no Recife, dentre as vítimas cinco pessoas ainda seguem desconhecidas, sendo um homem, duas mulheres e duas crianças do sexo masculino, com idade estimada em nove anos.

Vale lembrar que a lista de nomes ainda será atualizada à medida que novas informações forem divulgadas.

*O Governo do Estado de Pernambuco ainda não divulgou a lista oficial com os nomes das vítimas. Os nomes citados são apuração do Sistema Jornal do Commercio. 

CHUVA NO RECIFE NÃO É NOVIDADE

Não é a primeira vez que o Recife é acometido por tragédias desse tipo. No século passado, a população vivenciou momentos de terror semelhantes.

Em 1975, mais precisamente na madrugada do dia 17 e o início da tarde do dia 18 de julho, a capital pernambucana sofreu a maior catástrofe natural de sua história, causada pelo transbordamento do Rio Capibaribe.

Sérgio Bernardo/JC Imagem
Transbordamento do Rio Capibaribe marcou Recife em 1975 - Sérgio Bernardo/JC Imagem

A enchente provocada pelo transbordamento do Rio Capibaribe causou a morte de 104 pessoas e deixou cerca de 350 mil desalojados, cobrindo 80% do território do Recife.

A tragédia atual, espera-se que supere a vivida no século XX e torne-se a maior tragédia do século XXI. 

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